segunda-feira, 2 de novembro de 2020

Novas Lembranças

 

  • Filho, vai brincar um pouco do lado de fora. Disse a mãe passando em frente a sala, enquanto carregava uma bolsa com certa dificuldade.


O menino fez como se não tivesse escutado e continuou com os olhos vidrados na tela colorida.


  • Filho... Disse respirando fundo. Lucas! Advertiu a mãe com um pouco menos de paciência, enquanto desligava a televisão.

  • Ah não, mãe! Reclamou o menino.

  • Chega! Desse jeito você vai ficar vesgo! Vai brincar lá fora, vai no parquinho, respira um ar puro, não sei, mas televisão agora não! Disse atravessando a sala e finalmente livrando-se do peso da bolsa em cima da mesa de jantar.


O pai estava sentado na mesa, enquanto lia as notícias no seu laptop.


  • Desse jeito você que vai ficar vesga… Comentou ao olhar a papelada dentro da bolsa da esposa. 

  • O que você quer que eu faça? Essas provas não vão se corrigir sozinhas. Respondeu enquanto sentava e separava a papelada. Você bem que podia me ajudar e lavar umas louças, passar umas roupas, sei lá. Disse, cada vez mais vermelha, agora separando os papéis ferozmente.

  • Acabei de acordar, Camila! Me dá um tempo. Respondeu o marido. 

  • E daí? Seu braço vai cair se me ajudar um pouco?

  • Hoje é sábado! Relaxa... Respondeu enquanto bebia um longo gole de café.

  • Ahh… Adorei, Eduardo! Disse ironicamente. Você fala como se, no sábado, todas as nossas responsabilidades fossem magicamente zeradas!


A mãe estava cada vez mais nervosa e o casal continuou a trocar farpas sobre problemas não muito relevantes. O filho, ao escutar a discussão dos pais, alcançou o controle remoto e ligou a televisão novamente no som máximo.

Alguns segundos depois, os pais perceberam o que o filho tinha acabado de fazer, e perceberam que enquanto ele olhava a tela da televisão, apertava os ouvidos com as mãos até as bochechas ficarem rosadas de tão apertadas. 

A mãe encheu os pulmões de ar por alguns segundos com a intenção de dar uma bela bronca no filho, mas o pai a interrompeu imediatamente ao fazer um breve gesto de espera.

O pai levantou, buscou o controle remoto, desligou a televisão, ajoelhou diante do filho e disse sorrindo:


  • Hoje é sábado. Sabe o que isso quer dizer?


O menino escorregou as mãos pelas bochechas observando o pai. Seus olhos estavam vermelhos e sua respiração estava curta. Ele respondeu fazendo que não com a cabeça.


  • Hoje é dia de picnic na lagoa. Respondeu animado. E hoje eu vou te ensinar a andar de skate!


O menino abriu um sorriso e abraçou o pai. 

  • Você promete, pai?

  • Prometo. Respondeu bagunçando o cabelo do filho.

  • Ótimo. Assim eu posso ter um pouco de paz nessa casa. Disse a mãe, enquanto organizava a sua papelada.

  • Não senhora. Advertiu o pai. Você foi intimada a comparecer ao nosso picnic!

  • Eduardo, não começa vai. Replicou impaciente.

  • Por favor, mamãe… Suplicou o filho.


A mãe olhou para o menino e para o esposo e revirou os olhos.

  • Eu não acredito nisso… Mas eu preciso estar de volta às 17h da tarde!


Os três saíram de casa em direção a lagoa carregando uma enorme cesta de picnic. O dia estava ensolarado e a lagoa estava repleta de crianças brincando, jovens fazendo exercícios físicos, famílias de todas as idades aproveitando o sábado de sol, enquanto caminhavam em meio a turistas e cariocas. 

O pai avistou um lugar vazio na grama para estender a canga de picnic e os três organizaram um belo banquete.


  • Modéstia parte, esse lanche está me dando água na boca. Disse Eduardo enquanto aproveitava o cheiro dos quitutes estendidos.

  • Hummm, eu amo sanduíche de geléia, disse o menino suspirando.

  • Olha filho, disse a mãe apontando para cima. Uma borboleta azul!


A borboleta voou até pousar lentamente no sanduíche do menino e se exibir por alguns segundos antes de voar novamente.


  • Uau ... contemplou o menino. Eu nunca tinha visto uma borboleta tão perto! Ela é muito linda!

  • Sim. A mãe concordou sorrindo.


Há poucos metros dali, um casal começou a tocar uma música no violão e a mãe olhou surpresa para o pai.

  • Lembra dessa música? Disse o pai sorrindo.

  • Como eu poderia esquecer? Respondeu a mãe com o rosto corado.

  • Que música é essa? Perguntou o menino enquanto sugava um suco de caixinha.

  • Essa é a música que estava tocando no restaurante no dia que a sua mãe me contou que estava grávida de você. Disse o pai sorrindo.

  • E sabe o que o seu pai fez? Continuou a mãe. Ele ficou tão feliz que me tirou pra dançar!


O menino sorriu ao ver o pai estendendo a mão em direção a mãe. Sua mãe olhou para os lados, mas eventualmente cedeu ao gesto e segurou a mão do pai. Os dois começaram a dançar lentamente ao som do violão. Ao final da música, perceberam que mais quatro casais também estavam dançando e todos aplaudiram.


  • Pai, me ensina a andar de skate agora? Perguntou o menino animado.

  • Sim senhor! Respondeu prontamente.

O pai ensinou o filho a ficar em pé no skate, e depois de algumas tentativas e leves tombos, o menino já conseguia ensaiar um deslize perfeito pelo calçadão da lagoa.

  • Uhull. Comemorou o menino. Olha mãe!!

A mãe aplaudiu e sorriu. Fechou os olhos por alguns segundos e pode sentir a sensação de calor que o sol transmitia ao tocar no seu rosto misturado com a briza do vento que trazia um frescor leve e refrescante. Respirou fundo e pode sentir uma tranquilidade que há tempos não sentia.

  • Olha mãe, um macaquinho! Disse o filho apontando para um pequeno mico curioso que os observava de cima de uma árvore.

  • Que bonitinho. Respondeu a mãe. Nossa, há muitos anos que não via um mico!

  • Quer dar uma banana para ele? Perguntou o pai.

  • Sim!! Respondeu o filho prontamente.

Os dois alimentaram o mico e observaram ele se deliciar ao provar a banana madura. Os três aproveitaram o resto do dia ensolarado em meio a natureza, enquanto escutavam música e saborearam o picnic.

  • Querida, já são 17:30, observou o marido preocupado.

  • Não tem problema. Respondeu a esposa tranquilamente. Amanhã eu corrijo as provas, vamos aproveitar o resto do dia.

O esposo sorriu aliviado.

  • Filho, hoje vamos pedir delivery de comida para jantar! O que o senhor gostaria de comer? Perguntou o pai enquanto fazia cosquinhas no filho.

  • Pizza!!! Gritou o menino animado.


Os três voltaram para casa naquela noite estrelada, totalmente reenergizados. Prometeram um ao outro que fariam um programa parecido pelo menos uma vez na semana e agradeceram pelo dia incrível que tiveram juntos em família. Enfim, puderam perceber o que realmente era importante. Não eram longas horas de trabalho ou ficarem horas atrelados ao computador ou a televisão, e sim o tempo que passavam juntos em família, era isso que realmente importava. 


FIM


quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Anjo Gabriel



Era uma vez, um anjinho muito bonitinho. Seu nome era Gabriel, e hoje era o seu aniversário de 10 anos no céu. Gabriel tinha os olhos verdes e amarelados como um gato e os cabelos pretos enrolados. Como presente de aniversário, seu tio, Pedro, prometera dá-lo a sua primeira responsabilidade como Anjo da Guarda. Há tempos que Gabriel pedia a seu tio um presente como aquele, mas o anjo mais experiente sabia que não era uma tarefa fácil.


  • Parabéns anjo Gabriel! Finalmente chegou o grande dia! Hoje você vai virar oficialmente o anjinho da guarda de duas crianças. Disse seu tio orgulhoso, enquanto anunciava a grande surpresa.


Gabriel arregalou os olhos e começou a dar vários pulinhos de alegria entre as nuvens.


  • Eu não acredito! Eu, Gabriel o anjo da guarda de duas, DUAS crianças!!! Uhuuulll. Comemorava jogando as nuvens para o alto, enquanto estufava o peito orgulhoso de si mesmo. 

  • Sim. Afirmou o tio enquanto ria timidamente da reação do sobrinho. Agora preste bem atenção no que eu vou te dizer. 


Gabriel parou de pular para prestar a atenção na explicação do tio.


  • A garotinha se chama Beatriz e o seu irmão se chama João. Os dois vão para a escola todos os dias a pé, mas recentemente um novo vizinho se mudou para lá com um Pitbull…

  • O que é um Pitbull? Perguntou o anjinho atento.

  • Pitbull é um tipo de cachorro. Respondeu o tio.

  • Ahhh eu amo cachorrinhos!! Disse o anjinho animado.

  • Eu também...a verdade é que a maioria dos cachorrinhos são bonzinhos, mas esse não é. Afirmou o tio preocupado.

  • Não é? Por que? Perguntou o anjinho.

  • Porque infelizmente...quando o dono trata o cachorrinho mal, ele pode ficar muito bravo. E é esse o caso. O dono desse Pitbull é uma pessoa muito ruim, e por isso o cachorrinho ficou bravo.

  • Tadinho -- Lamentou Gabriel.

  • Eu preciso que você acompanhe a Beatriz e o João até a escola, porque pelo que vi, o vizinho deixou o Pitbull solto pela vizinhança e não é seguro para as crianças. Entendeu?

  • Sim senhor! Respondeu o anjinho prontamente.

  • Ótimo. Agora vá se preparar.


Gabriel deu um pulo e disse:


  • Estou pronto, tio!

  • Última coisa- disse o tio antes de abrir o portal entre o céu e a Terra. Não se esqueça que isso é um teste. Depois que tudo der certo, você será oficialmente promovido a Anjo da Guarda.

  • Sim senhor! Respondeu o anjinho.

Num passe de mágica, Pedro tocou o seu grande cajado duas vezes no chão e em sua frente, apareceu o grande portal dourado.


  • U-a-U -- exclamou Gabriel.

  • Boa sorte. Disse o tio.


Gabriel entrou no portal e, em menos de um segundo, estava em frente a uma casa. A parte de fora da casa era de tijolinhos e entre as frestas tinha várias plantas que subiam até as janelas e coloriam a casa inteira de verde. De repente, pode avistar duas crianças saindo da casa com as mochilas da escola.


  • Boa aula, meus amores. E não esqueçam de comer o lanche todinho eihn. Disse a mãe, enquanto se despedia de Beatriz e João.


As duas crianças começaram a andar pela rua calmamente e Anjinho Gabriel foi atrás.


  • Bia, você quer fazer uma aposta? Perguntou João.

  • Ah João, não começa vai… respondeu a menina já sem paciência para os jogos do irmão.

  • É sério, Bia! Olha, disse apontando para uma casa no final da rua. Eu aposto que você não consegue correr mais rápido do que eu até aquela casa.

  • Você acha que eu sou mais devagar do que você? Retrucou a menina.

  • Eu aposto que eu sou mais rápido!

  • Então tá bom! Vamos lá. Disse Beatriz se preparando para iniciar a corrida.

  • Um...dois...Contava João lentamente.

  • Rrrrrrrrrrrr.


As duas crianças escutaram o rosnar de um cachorro e paralisaram imediatamente. Anjinho Gabriel, que estava atendo a aposta, nem tinha percebido o cachorro logo atrás deles, virou para trás para entender o que estava acontecendo e se deparou com um enorme e assustador Pitbull mostrando os dentes. Gabriel deu um pulo para trás.


  • Oi cachorrinho, tudo bem? Disse o anjinho, enquanto suas pernas tremiam de medo. Vá já embora, aqui não tem nada para você. 


Infelizmente o cachorro ignorou o anjinho como se não tivesse ninguém ali e mais uma vez rosnou ferozmente.


  • João -- sussurrou Beatriz. Tenta pegar o meu lanche que está dentro da minha mochila e dá pra ele.


João não conseguia se mexer e, como era de costume, fez xixi nas calças de medo. Imediatamente, o anjinho, ao escutar o pedido da menina, abriu a sua mochila e o seu lanche caiu no chão. O cachorro levou um susto ao escutar a lancheira cair no chão e deu um pulo para trás apreensivo. A menina começou a se abaixar calmamente para abrir a lancheira, mas o cachorro se assustou novamente e partiu para cima das crianças. As duas começaram a correr o mais rápido que podiam, enquanto o cachorro as perseguia ferozmente.

  • Ai meu Deus! E agora? Exclamou o anjinho desesperado.


O Anjinho teve a ideia de molhar um pouco o chão com sabão e o cachorro começou a patinar, o que ele não imaginou era que as crianças também caíram no chão e deslizaram rua abaixo.


  • OPS! Disse o anjinho ao perceber o que tinha feito.


No final da rua, havia uma feira, onde vários comerciantes estavam vendendo frutas frescas, como era de costume nas sextas-feiras. De repente, uma senhorinha observou as duas crianças escorregando rua abaixo e logo atrás o cachorro, se aproximando rapidamente da feira.


  • Cuidado! Alertou a velhinha para os feirantes. 


O Anjinho imediatamente fez com que todas as caixas de papelão da feira ficassem empilhadas para que ninguém pudesse se machucar. Dois segundos depois, Beatriz, João e o cachorro bateram nas caixas de papelão com força total. Todas as pessoas da feira correram para ajudar, mas graças ao anjinho, ninguém se machucou. O cachorro ficou totalmente tonto e saiu cambaleando entre as pessoas.


  • Meu Deus! Exclamou a senhorinha. Vocês estão bem? Perguntou preocupada para as crianças.

  • Sim -- respondeu João. A gente estava fugindo de um cachorro!

  • Nossa! O anjinho da guarda de vocês estava atento hein. Ainda bem que vocês bateram nas caixas de papelão e ninguém se machucou. Disse a senhora aliviada. Alguém pega esse cachorro! Gritou a senhora.


Um outro senhor pegou rapidamente o cachorro que ainda estava se recuperando.


  • Eu sei de quem é esse Pitbull. Disse o senhor. Vou levá-lo para casa e dar uma bela bronca em seu dono! Disse o senhor.


As duas crianças levantaram-se calmamente do chão, enquanto se recuperavam do susto.


  • Aposto que foi o meu anjinho da guarda que salvou a gente. Disse Beatriz para o irmão.

  • Claro que não! Aposto que foi o meu! Retrucou o irmão.

  • O seu? Você tava fazendo xixi na calça, João! Implicou a irmã.


De repente o anjinho foi puxado para cima e quando viu, estava no céu diante de seu tio.


  • Tio Pedro, eu sei que o Senhor deve estar muito desapontado comigo. Disse enquanto olhava para baixo.

  • Desapontado? Por que? Perguntou o tio surpreso.

  • Você não está bravo? Perguntou o anjinho receoso.

  • Por que estaria bravo? Você salvou as duas crianças do cachorro. Fez um ótimo trabalho! Poderia ter sido um pouco mais discreto, mas foi a sua primeira vez. É a prática que leva a perfeição, e é assim que se aprende.

  • Jura? Perguntou o anjinho arregalando os olhos. Você viu tio? Como eu fiz? Eu joguei sabão e o Pitbull fez PUM, escorregou no chão e…


O anjinho continuou a contar a história nos mínimos detalhes para o tio, enquanto rolava e encenava teatralmente entre as nuvens o que tinha acabado de acontecer. Como havia prometido, o tio nomeou o Anjinho a Anjo da Guarda oficial dos irmãos e a noite no céu foi de festa.


FIM


sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Filomena e o Bacalhau Dourado


Filomena e o Bacalhau Dourado


Era uma vez, há muito, muito tempo atrás, uma menina chamada Filomena. Com apenas sete anos, já era considerada a mais bela do vilarejo. Filomena tinha os cabelos castanhos avermelhados e os olhos verdes Esmeralda. Seu pai, um comerciante bem sucedido, recebia propostas de casamentos para sua filha quase diariamente. A menina crescia mais bela a cada dia, porém, numa tarde fria, Filomena resolveu passear pela cidade em busca de um bacalhau dourado. Havia uma lenda no vilarejo sobre um bacalhau mágico. Se alguém conseguisse capturá-lo, assá-lo e por fim, comê-lo teria riqueza e prosperidade para sempre. 


Na véspera do seu oitavo aniversário, a menina estava disposta a achar o bacalhau e garantir uma vida mais tranquila para o querido pai. Seu pai já era um senhor e o trabalho como comerciante estava cada vez mais difícil. As mercadorias estavam cada vez mais caras e seu pai tinha que trabalhar longas horas antes de poder descansar em casa e aproveitar o seu tempo livre com a família. 


Filomena calçou suas botas e marchou até o outro lado da cidade, onde diziam, havia o Rio das Tentações. Ninguém jamais conseguiu capturar o bacalhau, pois o rio em que morava era cheio de ilusões e armadilhas. Determinada, Filomena foi mesmo assim. 


Algumas horas depois, a menina avistou o rio. – É tão pequeno. Pensou. O rio era liso como um tapete e sua cor era amarela tipo banana, em volta havia árvores altíssimas e seus frutos eram cogumelos gigantes. – Cogumelos? Estranhou Filomena. Ao olhar um dos frutos de perto, percebeu que ele se abriu e de dentro saiu um duende dorminhoco. Enquanto o duende se espreguiçava, Filomena o observava assustada.


-       Eu não sabia que os duendes vinham dos cogumelos. Exclamou. O duende levou um susto, se atrapalhou e caiu no chão.

-       Você não podia estar aqui! Esta terra é mágica e coisas terríveis acontecem com estrangeiros que não foram convidados. Disse o duende assustado.

-       Eu não sabia que tinha que ser convidada. Eu vim pescar o bacalhau dourado. Disse a menina animada.


Filomena virou de frente para o rio e enfiou a cabeça na água. Com os olhos abertos, conseguia ver vários peixes nadando tranquilamente. O duende, apavorado, começou a puxar o pé da menina, mas ele era tão pequeno, que não fazia nem cosquinha. De repente, a menina viu o rabo dourado do bacalhau, e sem pensar duas vezes, mergulhou ao seu encontro. Em baixo d'água, Filomena começou a nadar cada vez mais rápido, até que em um relance, pegou o rabo do peixe e correu para fora do rio.


-       Peguei! Gritou animada.


O duende fugiu rapidamente para dentro do cogumelo e se escondeu. O rio começou a borbulhar e sua cor amarela começou a escurecer e virar um marrom escuro. Começou a ventar e a menina olhou para os lados procurando o duende. De repente, sentiu alguém tocando o seu ombro. Quando virou, quase caiu pra trás de susto. Era uma mulher de olhos vermelhos, pele enrugada, com o nariz de tucano e cabelo de pele de cobra. Filomena arregalou os olhos e deixou cair o peixe, já sem cor, no chão.


-       Eu ouvi dizer que uma ladrazinha entrou na minha casa e pegou o meu bem mais precioso. Disse a mulher assustadora.

-       Eu não sou uma ladra se-se-senhora. Meu nome é Filomena! Disse gaguejando. Eu queria pegar o bacalhau dourado e dar pro meu pai. Eu quero que ele consiga trabalhar e voltar mais cedo pra poder brincar comigo.

-       Eu não sinto pena do seu pai, pequena Filomena. Infelizmente não posso cumprir os seus desejos e preciso puni-la.


A mulher pegou os braços de Filomena, antes que ela pudesse protestar.


-       Eu ordeno que toda a sua beleza evapore e que você nunca encontre o amor verdadeiro. Disse a mulher num tom macabro.


Um raio caiu sobre o rio e Filomena foi coberta por uma fumaça azul escura.


Quando Filomena se olhou no reflexo d'água, tinha a aparência igual a da mulher e a bruxa estava linda como Filomena um dia cresceria a ficar.

-       O que você…? Perguntou a menina confusa.

-       Esse é o seu castigo. Disse a mulher convencida enquanto dava de costas e ia embora.

-       Nem pensar! Gritou a menina enquanto pulava na mulher e puxava seus cabelos.

-       Me solta! Gritou a mulher empurrando Filomena. Você devia pensar duas vezes antes de pegar o que não é seu. De repente, a mulher entrou no rio e desapareceu.


Filomena ficou arrasada, sentou-se de frente para o rio e começou a chorar.


-       Eu te avisei. Disse o duende.

-       Eu só… eu só queria uma mãe de novo. Eu não sabia que… de repente, uma lágrima do seu rosto caiu no bacalhau. O peixe se iluminou novamente e seu rabo começou a bater.

-       Filomena! Você tem mágica também? Perguntou o duende espantado.

-       Eu não sei! Disse a menina feliz em ver o bacalhau vivo. Aproximou-se da água e colocou o peixe na beirada. Ele saiu nadando, e a água voltou a ser cor de banana.

-       Mas, você poderia ter realizado os seus desejos. Disse o duende.

-       Acho que eu já roubei o suficiente por hoje. Disse a menina triste. Foi um prazer, senhor duende.

-       Espera. Disse a mulher saindo do rio. Se você é um ser mágico, esta é sua casa também. E eu acho que você teve uma boa lição por hoje.


A mulher pegou os braços da menina e devolveu a sua beleza.


-       Obrigada. Disse Filomena.

-       Volte sempre. Respondeu a mulher enquanto voltava pro rio.


Filomena voltou correndo pra casa e ao chegar em frente ao seu portão de entrada viu seu pai abraçando a sua mãe animado. 

  • Papai, o que aconteceu? Perguntou Filomena se aproximando dos dois.

  • Minha querida! Exclamou o pai animado. Estamos ricos! Olha a quantidade de ouro, minha filha!! Disse ao entrar em casa e mostrar para Filomena um baú recheado de ouro.

Filomena sorriu e ao olhar pela janela, viu que do outro lado da rua, estava a mulher do rio sorrindo. Filomena sentiu-se feliz pelo pai. Piscou para a mulher e a acenou contente.

FIM


segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

O menino que desmaiava e o morcego gigante



Há muito, muito tempo atrás, numa terra muito distante, existiam dois irmãos. O mais velho, Tomás era muito corajoso e atlético e o mais novo, Pedro tinha um probleminha um tanto quanto peculiar… toda vez que tomava um susto ou tinha medo de alguma coisa, desmaiava. Seus pais já estavam acostumados com a condição do menino, por isso sempre pediam para o filho mais velho ficar de olho no irmão. O passatempo predileto dos meninos era pescar no Rio perto de casa, mas era preciso prestar atenção no tempo, pois existia um toque de recolher na cidade. Todo dia, a partir das seis da tarde, todos deveriam entrar dentro de casa e fechar todas as portas e janelas, pois era a hora que o morcego gigante saia para caçar. O morcego era o predador mais poderoso da região e comia qualquer coisa que se colocasse em seu caminho.


Um belo dia, os meninos saíram para pescar no rio. O tempo estava meio fechado, mas prometeram aos pais que não iam demorar. De repente, uma nuvem cinza surgiu e cobriu o sol.

-       Tomás… Será que já está tarde? Perguntou Pedro começando a se preocupar ao olhar o céu escurecendo.

-       Claro que não, Pedro. Olha! Pesquei um enorme! Disse Tomás ao pegar um peixe.

De repente, a nuvem ficou negra e um relâmpago estourou com tudo nos ouvidos dos meninos. Pedro, apavorado, não conseguiu evitar e caiu duro desmaiado.


Um tempo depois, Pedro acordou com alguém dando tapinhas no seu rosto.


-       Acorda. Disse a sereia.

Pedro abriu os olhos e viu uma menina metade humana, metade peixe. Dessa vez, para sorte da menina, ele não ficou assustado, e sim fascinado.


-       Você é uma sereia? Perguntou Pedro

-       O que você está fazendo aqui fora a essa hora? Perguntou, preocupada, ignorando a pergunta do menino.

-       Eu… pensou Pedro ao tentar lembrar. Eu estava pescando com o meu irmão e… Tomás? Cadê você? Perguntou ao perceber que seu irmão não estava ali.

-       Não tem mais ninguém aqui. A chuva veio e o morcego gigante apareceu antes do horário normal… Acho que foi porque o tempo escureceu muito e ele deve ter achado que já era noite. Você estava desacordado…ele deve ter achado que você não servia mais pra nada e pegou seu irmão.


-       Ele pegou o Tomás?

-       Acredito que sim. Disse a sereia.


A sereia saiu completamente d’água e como num piscar de mágica, sua linda cauda de sereia se transformou em duas pernas e ela virou uma menina aparentemente normal. A sereia olhou para Pedro e disse que estava cansada de sentir medo do morcego e que estava disposta a encontrar seu irmão e acabar de uma vez por todas com o morcego. Disse ainda que tinha um amigo que podia ajudar. Ele sabia todos os caminhos da mata e farejava armadilhas à distância. A menina começou a assobiar bem alto e nem dois minutos depois, apareceu um tigre enorme correndo de dentro da mata.


-       Sereia! Cumprimentou o tigre. Quanto tempo!


Ao ver o enorme animal e seus dentes afiados, o menino levou um susto tão grande que desmaiou novamente. O tigre olhou assustado e a menina disse:


-       Não se preocupe, ele faz isso. Disse desanimada.


Um tempo depois, Pedro começou a acordar, e quando levantou viu a sereia e o tigre no maior papo. Tremeu todo, e quando sentiu que ia fraquejar a sereia já veio dizendo:


-       Nem pense em desmaiar de novo! Pedro, esse é meu amigo Tigre. Ele é do bem, relaxa.

-       E ai, cara? Tudo bem? Perguntou o Tigre simpático. Já estou sabendo do seu irmão… aliás, chamei uma amiga minha pra dar uma mãozinha…

De repente, uma águia enorme apareceu batendo suas longas asas e posou em frente aos três.

-       Olá! Meu nome é águia, prazer.

-       A águia sabe todos os caminhos possíveis, pois enxerga tudo de cima. Ela não erra nada! Disse o Tigre.

-       Ah, que isso --disse a águia com as bochechas coradas.

-       A gente precisa encontrar a casa do morcego antes que meu irmão vire o jantar dele. Disse Pedro.

-       Pois bem, sorte sua que eu sei o caminho. Disse a águia.


Os quatro começaram a caminhar pela floresta, quando o Tigre farejou algo estranho.


-       Espera. Tem mais alguém aqui. Disse olhando para os lados.


Uma cobra enorme apareceu descendo por uma árvore, e num bote certeiro, enrolou o tigre e a menino. Os dois começaram a torcer para o menino não desmaiar, mas… era tarde demais… o menino já estava babando de cara no chão. A águia então cercou a cobra e deu-lhe uma bicada forte que soltou o tigre e o menino. A cobra fugiu assustada.


Um tempo depois, o menino acordou e ao olhar para os lados percebeu que estava se movimentando pela floresta. Piscou os olhos e balançou a cabeça e quando viu, se deu conta que estava deitado nas costas do tigre.


-       Bom dia, Bela Adormecida. Brincou o tigre.


Depois de uma boa caminhada, chegaram de frente a uma lagoa.


-       Precisamos atravessar essa lagoa e depois chegaremos na casa do morcego. Disse a águia.


Os três começaram a andar pela água e a águia foi sobrevoando por cima. De repente, a águia viu uma sombra de algum animal dentro d’água. Quando chegou mais perto, viu o que realmente era e gritou:


-       Jacaré!!!!!!!!!

-       Ãh? Perguntou o Tigre sem entender.

-       Jacaré!!!!!!! Gritou a águia.

-       Já deu ré? Perguntou a sereia.

-       Ja-ca-re… Repetiu o menino sem acreditar nas próprias palavras.


O jacaré ficou com sede na boca e todos começaram a correr e é claro, o menino desmaiou em cheio de cara na água. A sereia deu uma rabada na cara do jacaré que deu uma cabeçada no menino que voou longe. O jacaré ficou tonto, mas logo começou a nadar de volta. Quando o tigre deu o bote para atacá-lo, o menino caiu com tudo em cima dele. O jacaré se preparava para atacar, mas a águia deu-lhe uma bicada no traseiro. O jacaré deu um pulo e disse:


-       Bando de malucos! Vou embora. Partiu revoltado.


Um tempo depois o menino acordou e todos já estavam quase chegando na casa do morcego.


-       Ali. Apontou a águia. A caverna do morcego é ali.


O lugar era muito escuro e assustador. Todos entraram de fininho. De repente, o menino viu seu irmão preso em baba de morcego.


-       Tomás. Disse Pedro correndo ao seu encontro.

Antes de alcançá-lo, o morcego gigante apareceu na sua frente. O Tigre e a sereia ficaram prontos para atacá-lo, pois sabiam que o menino desmaiaria a qualquer momento. Mas ao invés disso, o menino levou um susto tão grande, que deu um grito altíssimo. O morcego, desesperado com o barulho, começou a se debater nas paredes da caverna. O tigre percebeu que as paredes iam cair a qualquer momento e correu para buscar Tomás. A caverna começou a desabar. A menina conseguiu tirar Pedro a tempo. Quando saíram, viram que a caverna tinha sido destruída e o morcego tinha ficado preso.


Pedro e Tomás voltaram pra casa sã e salvos, graças a seus novos amigos. A cidade se viu livre das ameaças do morcego e finalmente todos puderam ter uma vida normal de novo, sem se preocupar com a segurança da população. 

Depois do episódio, Pedro nunca mais desmaiou de medo e percebeu que podia ser muito mais corajoso do que pensava. Tomás agradeceu aos novos amigos e todos na cidade ficaram agradecidos aos heróis que prenderam o morcego gigante.


FIM